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STF e Convenção de Montreal: o cenário atual do ressarcimento securitário de cargas

A discussão quanto à extensão do direito de regresso da Seguradora em sinistros que decorrem do extravio da carga em transporte aéreo internacional é tema controvertido e relevante, uma vez que pode trazer limitações aos valores regredidos. Assim, de um lado, o mercado segurador sustenta a aplicação do Código Civil, enquanto que de outro, os transportadores aéreos alegam que o diploma jurídico válido é a Convenção de Montreal (“Convenção”), ratificada pelo Brasil e promulgada por meio do Decreto 5.910/2006.


Em resumo, o Código Civil e, quando aplicável, o Código de Defesa do Consumidor, prevê o princípio da reparação integral no art. 944 do Código Civil: “a indenização mede-se pela extensão do dano.”. Deste modo, na eventualidade de uma perda ou extravio da mercadoria, caberá ao transportador, que responde objetivamente (ou seja, independente de dolo e culpa), indenizar integralmente aquele que teve seu bem perdido. Com base no direito do recebimento da integralidade da indenização pelo proprietário da mercadoria, a Seguradora se sub-roga e faz jus ao recebimento de igual valor, acrescido dos consectários legais de correção monetária e juros.


Por sua vez, a Convenção se verifica mais vantajosa para os transportadores aéreos, uma vez que limita o valor da indenização em caso de destruição, perda, avaria ou atraso a uma quantia de 17 Direitos Especiais de Saque por quilograma transportado (o que atualmente corresponde ao valor de R$ 131,41/kg); tal limitação só será superada se o expedidor tiver feito uma declaração especial de valor da carga e pagado, se for o caso, uma quantia suplementar pelo transporte (art. 22 da Convenção). Mas não é só, o prazo prescricional para reclamar eventual prejuízo do transportador aéreo é de 02 (dois) anos (art. 35 da Convenção), ao contrário dos usuais 03 (três) anos que norteiam muitas relações jurídicas (art. 206, §3º, inciso V do Código Civil).


Assim, utilizando-se dos precedentes RE 636331 e o ARE 766.618 do Supremo Tribunal Federal (“STF”), os transportadores aéreos tentaram buscar proveito para estender a aplicabilidade da tese firmada para todas as situações de transporte aéreo internacional, incluindo o de carga, o que, por sua vez, engloba as ações de ressarcimento propostas pelas Seguradoras sub-rogadas nos direitos e deveres de seus Segurados.


É válido fazer um parêntese para explicar os precedentes acima apontados, datado de 25/05/2017, em que o STF apreciou incidentes atrelados ao transporte aéreo internacional de passageiros, oportunidade em que se decidiu, por maioria de votos, a tese em repercussão geral nº 210 de que “nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor”.


Diante desse impasse, não demorou muito para que a controvérsia proposta entre Seguradoras e transportadores aéreos fosse apreciada pelo STF, que já se manifestou, em duas oportunidades, no sentido de que demandas relacionadas ao transporte aéreo de carga internacional também serão dirimidas pela Convenção.


No Recurso Extraordinário nº 1.241.089 (RE 1.241.089) interposto pela TAP – Transporte Aéreos Portugueses contra o acórdão da 37ª Câmara de Direito do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - que havia entendido ser descabido qualquer limitação do quantum ressarcitório - o Min. Relator Roberto Barroso deu provimento ao “recurso para determinar às instâncias de origem que apreciem novamente o feito, levando em consideração que a norma internacional que rege a matéria deve prevalecer para eventual condenação de empresa aérea internacional por danos morais e materiais”.


Em outra pretensão recursal, no Recurso Extraordinário nº 1242964 movido por LAN Airlines S/A contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo - que reconheceu ausência de limitação indenitária contra o pleito ressarcitório da Seguradora - o Min. Relator Luiz Fux entendeu que “havida a declaração do valor da carga transportada, circunstância que, nos termos das referidas Convenções, afasta a limitação da responsabilidade do transportador”, não há que se falar aplicação de “teto” para indenização, devendo, ser esta, portanto, integral e no valor exato dispendido pela Seguradora, acrescido dos consectários legais.

Desta forma, não é forçoso concluir que o entendimento do STF é de que todas as demandas envolvendo o transporte aéreo internacional sejam dirimidas à luz da Convenção, por ser norma mais específica ao tema.


Tal situação tem potencial de impactar as apólices de transporte de carga por modal aéreo em se estabelecendo este entendimento no STF e, por conseguinte, nas cortes inferiores. Deste modo, recomenda-se que a declaração de valor da carga seja documento obrigatório a ser realizado pelo Segurado, sob pena, eventualmente, de perda e/ou limitação de direitos da Seguradora em situação regressiva.


Neste sentido, recomenda-se que as Seguradoras instruam seus respectivos segurados a fazerem a declaração do valor da carga quando for entregue ao transportador, se esta for superior ao limite proposto pela Convenção, sob pena de não obterem o êxito desejado no ressarcimento.


Isto porque, de acordo com o art. 22 da Convenção, a declaração de valor da carga é a única forma de evitar o limite de 17 Direitos Especiais de Saque por quilograma em caso de sinistro, sendo, portanto, condição sine qua non para que o direito ao ressarcimento seja exercido em sua plenitude pela Seguradora.


Em conclusão, as áreas de subscrição de risco e regulação de sinistro deverão estar atentas a essa peculiaridade imposta pela Convenção para resguardar os direitos da Seguradora a ressarcir-se integralmente.


Em caso de dúvidas, o Escritório RPZ Advogados conta com time especializado em assuntos de aviação e ressarcimento.



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